Nem por cem reinos!
“Ah!
– dirias – “se me oferecesses cem reinos, eu nunca seria tão idiota em
aceitar tais extremos tão brutais, não importa quantas coisas
importantes me oferecessem, mesmo que estivesse segura de que Deus iria
preservar a minha vida durante esses momentos de sofrimento.”
Em
segundo lugar, eu te pergunto: Se tu já estivesses na posse de um
grande reino, e estivesses nadando num mar de riqueza, de maneira que
não precisarias de nada, e fosses atacada por um inimigo, feita
prisioneira e acorrentada, se fosses obrigada a escolher entre perder o
teu reino ou passar meia hora dentro de um forno incandescente, o que
escolherias? “Ah! – dirias – prefiro passar toda a minha vida na pobreza
extrema e submeter-me a qualquer injúria e infelicidade do que sofrer
tão grande tormento!”
Uma prisão de fogo eterno
Neste
instante, dirige os teus pensamentos daquilo que é temporal para o que é
eterno. Para fugir do tormento de um forno ardente, que duraria somente
meia hora, tu sacrificarias qualquer propriedade, principalmente as
coisas que mais te satisfazem, e estarias disposto a sofrer qualquer
outro dano temporal, não importando quão trabalhoso pudesse ser. Então,
por que não pensas da mesma maneira quando discutes sobre os tormentos
eternos?
Deus
não te ameaça com meia hora de suplício dentro do forno ardente, mas,
pelo contrário, com uma prisão de fogo eterno. Para escapar dela, não
deverias renunciar a tudo o que está proibido por Ele, não importando
quão prazeroso possa ser, e abraçar alegremente tudo quanto Ele ordena,
mesmo que fosse extremamente desagradável?
O
mais espantoso do inferno é a sua duração. A pessoa condenada perde a
Deus e o perde por toda a eternidade. Aliás, o que é a eternidade? Ó
alma minha, até agora nenhum anjo pode compreender o que é a eternidade!
Como então poderás tu compreende-la? Ainda assim, para formarmos alguma
idéia sobre ela, consideremos as seguintes verdades:
A eternidade nunca termina. Esta é a verdade que tem feito tremer até os maiores santos. O juízo final virá o mundo será destruído, a terra engolirá todos os condenados, e estes serão lançados no inferno. Então, com sua mão todo-poderosa, Deus os encerrará para sempre em tão amaldiçoada prisão.
A eternidade nunca termina. Esta é a verdade que tem feito tremer até os maiores santos. O juízo final virá o mundo será destruído, a terra engolirá todos os condenados, e estes serão lançados no inferno. Então, com sua mão todo-poderosa, Deus os encerrará para sempre em tão amaldiçoada prisão.
Desde
então, tantos milênios se passaram como há folhas nas árvores e nas
plantas de toda a terra, tantos milhares de anos, como existem gotas de
água em todos os mares e rios da terra, tantos anos com existem átomos
no ar, como existem grãos de areia em todas as praias de todos os mares.
Logo, depois de passarem todos estes incontáveis anos, o que será a
eternidade?
No
entanto ela não será sequer uma centésima parte dela, ou uma milésima –
nada. Então começará novamente e durará tanto como antes, novamente,
assim por diante, até que haja se repetido mil vezes, e um bilhão de
vezes, novamente. E logo depois de um período de tempo tão longo, nem
sequer terá passado a metade, nem sequer uma centésima parte ou uma
milésima parte, nem sequer uma parte da eternidade. Em todo este tempo
não haverá interrupção na queima dos condenados, começando tudo
novamente.
Oh! que mistério profundo! Um terror sobre todos os terrores! Oh! eternidade! Quem pode comprender-te?
Suponhamos
que, no caso de maldito Caim, chorando no inferno somente derramasse a
cada mil anos uma única lágrima. Agora, alma minha, guarde os teus
pensamentos e leve em consideração este fato: por seis mil anos, no
mínimo, Caim tem estado no inferno e tem derramado apenas seis lágrimas,
que Deus milagrosamente lhe preservara.
Quantos
anos levariam para que as suas lágrimas cobrissem todos os vales da
terra e inundassem todas as cidades, povos e vilas e todas as montanhas
até que inundasse toda a terra? Sabemos que a distância entre a terra e o
sol é de trinta e quatro milhões de léguas. Quantos anos faltariam para
que as lágrimas de Caim enchessem este imenso espaço? Da terra ao céu
estimamos que haja uma distância de cento e sessenta milhões de léguas.
As lágrimas de Caim
Oh!
Deus! Que quantidade de anos teríamos que imaginar que seria necessário
para encher de lágrimas este imenso espaço? E ainda assim – Oh! Verdade
incompreensível! – estejam seguros disto, porque Deus não pode mentir –
chegaria o tempo em que as lágrimas de Caim seriam suficientes para
inundar o mundo, para alcançar inclusive o sol, para tocar o céu, e
encher todo o espaço entre a terra e o mais alto do céu. Isso, porém,
não é tudo.
Se
Deus secasse todas estas lágrimas desde a última gota, e Caim começasse
chorar outra vez, ele voltaria outra vez a encher o espaço inteiro e o
inundaria mil vezes e um milhão de vezes em sucessão, ao longo de todos
esses incontáveis anos, nem sequer haveria passado a metade de
eternidade, nem sequer uma fração. Depois de todo esse tempo, ardendo no
inferno, os sofrimentos de Caim estariam tão somente começando.
A
eternidade, neste caso, não tem alívio. Seria de fato uma pequena
consolação, de muito pouco benefício, para as pessoas condenadas, se
fossem capazes de receber um breve alento a cada mil anos.