Poucos são os santos da Igreja privilegiados como São Filipe Néri. Filho de pais nobres e piedosos, Filipe nasceu em 1515, na cidade de Florença. A boa índole, os modos afáveis e a inclinação à oração mereceram ao menino de 5 anos o apelido de "o bom Filipe". Um incêndio destruiu grande parte da fortuna dos pais e Filipe passou a morar com um primo que era negociante riquíssimo em São Germano. Este primo prometeu-lhe estabelecê-lo como herdeiro de todos os seus bens se quisesse tomar-lhe a gerência dos negócios. O bom Filipe, porém, pouca inclinação sentia para ser negociante; o que queria era ser santo e, apesar das repetidas insistências do primo, resolveu dedicar-se ao serviço de Deus.
Fez os estudos de Filosofia e Teologia em Roma, e começou desde logo a observar regra de vida austeríssima, que o acompanhou até o fim da vida. Alimentava-se de pão, água e legumes; para o sono reservava poucas horas, para a adoração, porém, muitas. No grande desejo de dedicar-se à vida contemplativa, vendeu a biblioteca, deu os bens aos pobres e aprofundou o espírito na meditação da Sagrada Paixão e Morte de Jesus Cristo. Todo o tempo disponível passava-o nas igrejas ou, de preferência, nas catacumbas.
A graça de Deus tocou-lhe o coração com tanta violência que, prostrado por terra, exclamou muitas vezes: "Basta, Senhor, basta! Suspendei a torrente de vossas consolações, porque não tenho forças para receber tantas delícias. Ó meu Deus tão amável, por que não me destes um coração capaz de amar-Vos condignamente?" Foi nas catacumbas de São Sebastião, no ano de 1545, que recebeu o Espírito Santo, em forma de bola de fogo. Naquela ocasião sentia em si um ardor tão forte do amor de Deus que, devido às palpitações fortíssimas do coração, foram deslocadas a segunda e a quarta costelas.
Com o amor de Deus, grande era-lhe também o amor do próximo. Filipe possuía o dom de atrair todos a si, circunstância para a qual concorriam muito sua afabilidade, cortesia e modéstia. Recorria a mil estratagemas para ganhar os jovens das ruas e nas oficinas de Roma. Era amigo de todos e, uma vez adquirida a confiança, preparava-os para a recepção dos Sacramentos e encaminhava-os para o bem. As noites, passava-as nos hospitais, tratando os doentes como uma mãe. O monumento mais belo de sua caridade é a Irmandade da Santíssima Trindade, cujo fim principal era receber os romeiros e tratar dos doentes. No início de cada mês convidava o povo para adoração ao Santíssimo Sacramento e, nestas ocasiões, embora leigo, fazia admiráveis alocuções aos fiéis. A piedosa ideia achou eco entre o povo, que abundantes esmolas deitavam para a nova instituição. Cardeais, bispos, reis, ministros, generais e princesas viam grande honra em poderem pertencer a esta irmandade.
Grande parte do dia passava no confessionário e só Deus sabe o número das almas que a seus pés acharam a paz, o perdão e a salvação. Todos nele depositavam uma confiança ilimitada. Ilimitada também era a inveja e o ódio de Satanás e seus sequazes. Os confrades tiveram que saborear muitas vezes o escárnio, a calúnia e a perseguição. O ódio dos inimigos chegou a tal ponto que levaram uma acusação falsa à autoridade eclesiástica, de que resultou para Filipe a suspensão de ordens. Privado da celebração da Santa Missa, da pregação e da administração do Santíssimo Sacramento, o Santo não perdeu a calma e só dizia: "Como Deus é bom, que me humilha!" A suspensão foi retirada e o inimigo principal do Santo, caindo em si, fez reparação pública e tornou-se-lhe discípulo.
Pelo fim da vida já não lhe era possível dizer a santa Missa em público, tanta era a comoção que lhe sobrevinha na celebração dos santos mistérios. Estando no púlpito, as lágrimas lhe embargavam a voz quando falava do amor de Deus e da Paixão de Cristo. Quando celebrava a Missa, chegando à santa Comunhão, pelo espaço de duas a três horas ficava arrebatado em êxtase enquanto o corpo se lhe elevava à altura de dois palmos. Não é para admirar que o Papa o consultasse nos negócios mais importantes e quisesse beijar-lhe as mãos e a batina.
À sua prudência e clarividência deve a França a felicidade de ter permanecido país católico. Henrique IV, calvinista, tinha abjurado a heresia e entrado na Religião Católica. No ardor das guerras civis, tornou a voltar ao calvinismo, para depois outra vez se agregar à Igreja. O Papa Clemente VIII, com o apoio dos Cardeais, negou ao rei a absolvição e opôs-se-lhe à reconciliação. Filipe, prevendo a apostasia da França no caso de o Papa persistir nesta resolução, fez jejuns e orações extraordinárias e pediu a Barônio, que era confessor do Papa, que o acompanhasse nestes exercícios para alcançar a luz do Divino Espírito Santo. Posteriormente, Henrique IV obteve a absolvição do Papa e foi solenemente recebido no seio da Igreja.
Fatigado e exausto de trabalhos e alquebrado pela idade, Filipe foi acometido de grave doença; tendo os médicos examinado e saído do quarto sem ânimo, ouviram o doente exclamar: "Ó minha Senhora, ó dulcíssima e bendita Virgem!". Voltaram para ver o que tinha acontecido e encontraram o Santo elevado sobre o leito e, em êxtase exclamou: "Não sou digno, não sou digno de vós, ó dulcíssima Senhora, que venhais visitar-me!". Os médicos, respeitosos, indagaram ao doente o que sentia. Este, voltando a si e tomando a posição costumeira no leito, perguntou: "Não a vistes a Santíssima Virgem, que me livrou das dores?" De fato se levantou completamente curado e viveu mais um ano.
Tendo predito a hora da morte, Filipe fechou os olhos para este mundo no dia 26 de maio de 1595. O túmulo tornou-se glorioso e, poucos anos depois da morte, Filipe foi beatificado pelo Papa Paulo V, em 1622, e canonizado por Gregório XV.
(Texto extraído de “Na Luz Perpétua”, por Pe. J. B. Lehmann)
(Texto extraído de “Na Luz Perpétua”, por Pe. J. B. Lehmann)
Nenhum comentário:
Postar um comentário