terça-feira, 26 de abril de 2016

A inválida consagração do vinho invalida ou, no mínimo, projeta dúvida sobre a consagração do pão



Apêndice IV in Patrick Henry OMLOR, Questionando a Validade das
Missas que Usam o Novo Cânon com “Por Todos”
 [3.ª ed. ampl., 1969].
(5 de Maio de 1968)
Rev. Pe. Lawrence S. BREY (1927-2006)

1) INTRODUÇÃO. Mesmo se a Consagração do Vinho for inválida em razão de defeito de forma, e portanto a Missa inteira for inválida, sem embargo o sacerdote consagra verdadeiramente o pão numa Missa assim? Ainda que o vinho não venha a ser verdadeiramente consagrado, não teríamos ao menos Hóstias validamente consagradas, o verdadeiro Corpo Eucarístico de Cristo, contanto que a Consagração do Pão seja realizada fazendo uso da matéria e forma apropriadas? E, portanto, nosso povo não poderia ao menos ter a certeza de que recebe o verdadeiro Corpo e Sangue de Jesus na hora da Comunhão, numa Missa dessas?

A resposta a estas questões é um não com reservas, porque não há como ter certeza de que as hóstias são verdadeiramente consagradas; há, no mínimo, dúvida real e prática. De fato, alguns teólogos mantêm com certeza que, sob tais circunstâncias, o pão não é validamente consagrado.

2) NÃO HÁ SACRIFÍCIO SEM AMBAS AS CONSAGRAÇÕES. Em primeiro lugar, o sacramento do Corpo e do Sangue do Senhor nos foi dado única e exclusivamente dentro do contexto do sacrifício do Corpo e do Sangue de Cristo. “Toda vez que o sacrifício é oferecido, a consagração de ambas as espécies é necessária, segundo a Vontade e instituição de Cristo. Pois Cristo, na Última Ceia, consagrando cada uma das (ambas as) espécies, ordenou: ‘fazei isto em memória de Mim’ (Cf. I Cor. 11, 24-25) … (e) a noção mesma de sacrifício … exige a consagração de ambas as espécies.” (De EucharistiaNoldin-Schmitt, S.J., in: SUMMA THEOLOGIAE MORALIS, III. Innsbruck, 1940).

Pois a Consagração renova e celebra o Sacrifício da Cruz na medida em que a consagração de ambas as espécies separadamente produz a separação mística do Corpo e do Sangue de Cristo. “A consagração de ambas as espécies é exigida por Lei Divina para a essência do Sacrifício: sabemos disto pela própria Instituição (proferida) por Cristo, bem como pelo preceito e prática da Igreja, de modo que é necessária para que se tenha uma verdadeira representação do Sacrifício da Cruz.” (Brevior Synopsis Theologiae DogmaticaeTanquerey – Bord, Paris, 1952).

3) NÃO HAVENDO SACRIFÍCIO, NÃO HÁ SACRAMENTO. Nem tampouco há qualquer indicação em parte alguma de que Cristo tenha desejado que o sacramento da Eucaristia fosse confeccionado em separado do sacrifício propiciatório da Missa. Com efeito, a noção do sacramento, na Eucaristia, conforme a Vontade de Cristo não pode ser separada da noção do sacrifício(Noldin-Schmittloc. cit). De fato, na prática a lei da Igreja proíbe de maneira absoluta, sem nenhuma exceção, a consagração de só uma espécie sem a outra. O cânon 817 do Código de Direito Canônico determina: “É proibido, até mesmo em casos de necessidade extremos, consagrar uma espécie sem a outra…” O Missal Romano, na seção “De Defectibus”, prescreve que uma Missa interrompida depois da Consagração da Hóstia (devido a enfermidade ou morte do celebrante) deve ser continuada por outro sacerdote, i.e., que o vinho deve ser consagrado para completar e efetuar o Sacrifício (Cf. De Defectibusx, 3).


4) A CONSAGRAÇÃO DE SÓ UMA ESPÉCIE TORNA A VALIDADE NO MÍNIMO DUVIDOSA. Agora, quanto à validade da Consagração do Pão em caso de o Vinho por alguma razão não ser consagrado, os teólogos estão de acordo que uma tal Consagração do Pão seria válida somente se o celebrante tinha a intenção de realizar a segunda Consagração (a do Vinho), mas ficara incapacitado ou por alguma razão impedido de realizá-la. “Uma espécie é validamente consagrada sem a outra se o celebrante tem a intenção de realizar o sacrifício [mas aí então é interrompido] … Porém, nunca é lícito consagrar uma espécie se o celebrante prevê um defeito na outra espécie, porque por Vontade de Cristo a Consagração da Eucaristia tem de ser simultaneamente também o Sacrifício completo, o que certamente não seria o caso a não ser que ambas as espécies sejam consagradas.” (Epitome Theologiae Moralis Universae, ed. Dr. Carolo Telch, Innsbruck, 1924).

Assim, se o celebrante não tivesse a intenção de consagrar o vinho corretamente, a Consagração do Pão ficaria aberta a dúvidas. Alguns teólogos, com efeito, julgam que é certeza que, num caso desses, o pão não seria verdadeiramente consagrado. Porque um sacerdote que não tenha a intenção de consagrar o vinho (ou de consagrá-lo corretamente),ipso facto [= por esse fato mesmo (N.T.)] não teria a intenção de oferecer o verdadeiro Sacrifício ou de consagrar segundo a Mente de Cristo.

5) A OPINIÃO DE DE LA TAILLE. Maurice de la Taille, S.J. é um eminente teólogo moderno assim, que acreditava que uma tal consagração única do pão (sozinho) seria certamente inválida. No seu tratado sobre a Missa, ele observa: “[A] conclusão de Sto. Tomás permanece de pé: a de que a determinação da virtude propiciatória entra na forma da segunda consagração [por meio das palavras: que será derramado por vós e por muitos para o perdão dos pecados], mas não na da primeira [i.e., a consagração do Pão]. Ademais, porque no Cânon Romano nenhuma determinação de intenção propiciatória é expressada sobre o Corpo, por essa razão Sto. Tomás muito acertadamente ensinou que a nossa forma de consagração na Missa relativamente ao Sangue seria deficiente, e destarte ineficaz, se o restante das palavras [i.e., que será derramado por vós e por muitos para o perdão dos pecados] não fosse adicionado.” (De la Taille, “The Mystery Of Faith”, Livro II, p. 444, n. 1).

“Mas isso que nós mostramos ser suficiente para indicar a intenção propiciatória [i.e., a forma mais determinada: que será derramado por vós e por todos para o perdão dos pecadosé também de necessidade absoluta para o perfazimento da forma: porque entrementes, enquanto essa designação não foi dada [expressando o propósito ou fim pelo qual Cristo derramou o Seu Sangue], a fórmula não expressa ainda tudo o que precisa ser expressado, e assim não realiza coisa alguma: porque aqui, na realidade, o efeito e aquilo que é significado pela fórmula são indivisíveis.” (De la Tailleop. cit., p. 443, destaque adicionado).

“O que aconteceria então”, indaga De la Taille, “se um sacerdote, enquanto está consagrando o Corpo segundo o rito romano, tivesse intenção de pronunciar sobre o cálice somente as palavras: Este é o cálice do meu sangue? Consoante o nosso arrazoado, ele não consagraria destarte nem sequer o Corpo validamente. A razão disso é que ninguém consagra o Corpo validamente a não ser que tenha ao menos a intenção de consagrar também o Sangue … porque ninguém consagra validamente sem ter ao menos a intenção implícita de realizar o sacrifício. Ora, o sacerdote que exclui a intenção de aplicar essa forma mais determinada, da qual estamos falando, relativamente ao Sangue, realmente por esse meio exclui a intenção de consagração válida, em razão do que dissemos acima. Logo, ele exclui a intenção de realizar o sacrifício. Portanto, nem sequer o Corpo ele consagra validamente.” (De la Tailleop. cit., pp. 444-5, n. 1, destaque adicionado).

6) O CASO DO NOVO CÂNON EM INGLÊS. Ora, se a nova forma de Consagração em inglês foi mutilada de tal maneira (como parece ser o caso) a ponto de mudar a significação e intenção da forma de consagração e de alterar substancialmente a significação do elemento propiciatório da forma (mediante a substituição pelo “por todos os homens para que…”), destarte invalidando a Consagração do Vinho, temos uma situação equivalente àquela descrita por De la Taille. O celebrante, muito embora use a forma de consagração (em inglês) completa, está, por esse meio, usando uma “forma” com um elemento propiciatório mutilado, e portanto ele nem intenciona verdadeiramente oferecer, nem oferece realmente verdadeiro Sacrifício. E, assim, a sua consagração até mesmo do Pão é duvidosa; e consoante alguns teólogos (como vimos) ele certamente não consagra validamente o Pão.

Adicionando ainda mais peso a esta tese, vem a seguinte consideração: Uma “Missa” dessas (que contenha uma consagração só, ao invés da dupla consagração) seria totalmente alheia ao intento de Cristo e à Sua instituição do Sacramento e Sacrifício via a válida dúplice Consagração do Pão e do Vinho. Uma “Missa” dessas seria de fato uma aberração sacrílega. É difícil de conceber que Cristo permitiria que a presença de Seu Corpo Eucarístico se efetuasse sob tais circunstâncias.

7) CONCLUSÃO. Na prática, então, os que estão cientes do fato de que há no mínimo dúvida real quanto à válida consagração das hóstias “consagradas” em Missas que usem o “novo Cânon em inglês” (ou qualquer outro “Cânon” que incorpore semelhantes mutilações da forma de Consagração) não poderiam em consciência participar de uma “Missa” dessas nem receber a Comunhão com uma hóstia consagrada numa Missa dessas.

L.S.B.
5 de Maio de 1968
Festa de S. Pio V


Rev. Pe. Lawrence S. BREY, A inválida consagração do vinho invalida ou, no mínimo, projeta dúvida sobre a consagração do pão, 5 mai. 1968; trad. br. por F. Coelho (f.a.coelho@gmail.com), São Paulo, mar. 2016, blogue Acies Ordinata

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