Mons. Francisco Oligiatti
É sabido que nossos pecados podem ser mortais ou veniais conforme sejam
transgressões graves ou leves da lei moral. Sabe-se também que para que
haja pecado mortal se requer:
a) matéria
grave;
b) plena
advertência;
c) perfeito
consentimento.
Finalmente, ninguém ignora que só o pecado mortal nos tira a graça
santificante, e se chama mortal precisamente porque dá morte às nossas
almas privando-as do princípio de sua vida sobrenatural. Porém, não é
igualmente conhecida a natureza, e por isso mesmo a enormidade de nossos
pecados pessoais, que é mister distingui-los do pecado original, pois
deste último não temos uma responsabilidade pessoal (tão grande é esta
diferença que uma criança que morre sem o batismo, embora não alcance a
visão de Deus, não vai para o inferno). Para compreender o que é o
pecado se há de partir do fato de que Deus, o Ser perfeitíssimo, criou
todos os seres, e estes seres, por sua própria natureza, têm entre si e
com Deus certas relações que constituem a ordem. O pecado não é outra
coisa que o rompimento desta ordem querida por Deus. Assim, por exemplo,
a blasfêmia é um pecado porque a ordem exige que a criatura adore e
louve ao Criador, e o blasfemo, ao invés, insulta a Deus.
A impureza e a desobediência são pecados, porque ferem a ordem. E assim
se pode dizer de toda a culpa. Toda a culpa é essencialmente desordem.
A gravidade do pecado
Semelhante desordem podemos considerá-la sob três aspectos:
a) sobre o aspecto do sujeito, isto é, do homem que quebra a harmonia; e
aqui temos o grau de responsabilidade da consciência pela culpa, e por
conseguinte, a pena íntima do remorso, proporcionada à responsabilidade
subjetiva do indivíduo. Neste sentido é exato que o vício traz consigo o
seu castigo, como a virtude tem imanente em si o seu prêmio.
b) sobre o aspecto das coisas, isto é, da ordem transtornada, e aqui
aparece o problema do mal, cuja solução consiste em que Deus permite o
mal (que sempre se funde em algum bem, pois o mal puro seria o nada)
porque na desordem que causamos por nossa culpa, Ele sabe tirar o bem. O
Sr. Rodrigo é culpado induzindo José a raptar Lúcia, como Nero é
culpado perseguindo os cristãos; mas Deus se serve do mal produzido pelo
primeiro para conversão do próprio Inominado, e o sangue derramado
pelos cristãos para conversão do mundo. Noutras palavras, a Providência,
não obstante a desordem subjetiva que não exclui nas coisas, que
governa mas permite, tira sempre a ordem.
c) sobre o aspecto divino, já que tudo o que quebra a ordem querida por
Deus, em última análise, se revolta contra o criador da ordem. É verdade
que um ladrão não rouba para ofender a Deus, mas por amor à riqueza
alheia; mas fazendo assim, como não respeita a vontade divina, ofende a
Deus.
E ademais, qualquer pecado implica a negação da sujeição a Deus, e quase
atenta contra Ele mesmo, que é a ordem absoluta. Tudo vale, tanto na
ordem natural como na sobrenatural. Qual é, então, a gravidade do pecado
mortal?
a) sobre o primeiro aspecto, o pecado tem uma gravidade finita, pois a
nossa responsabilidade é sempre limitada; nosso ato é finito.
b) no segundo caso, a gravidade é indefinida, pois todo mal cometido
pode se comparar a uma pedrinha lançada no lago da sociedade, e que
produz ondas concêntricas que se vão estendendo cada vez mais. O efeito
de um mau exemplo não se limita ao que se o recebe, mas exerce um
influxo indefinidamente vasto. Aqui também nos achamos diante de uma
gravidade limitada.
c) ao contrário, sobre o terceiro aspecto a gravidade de um pecado
mortal é infinita. A prova no-la dá Santo Tomás com a sua clareza
habitual. A gravidade de uma culpa, diz o grande doutor, se mede pela
dignidade de uma pessoa ofendida. Assim, por exemplo, quando Bertolino,
estando em armas, tratou de cretino a um seu companheiro, simples
soldado como ele, não foi castigado; quando repetiu a insolência a um
cabo, teve dez dias de prisão; e tendo repetido ao tenente, ao coronel,
ao general e ao rei, os castigos foram em escala ascendente. Bertolino
protestava e pensava desta maneira: “a minha culpa é sempre a mesma;
nunca digo mais do que esta palavra: cretino. Então, por que esta
diversidade de penas e castigos? Isto é uma flagrante injustiça!”.
Sendo como era um Bertolino, não atinava que a gravidade da ofensa se
deduz sobretudo da dignidade da pessoa injuriada e, no entanto, a coisa é
bem clara. Pois bem, quando cometemos o pecado, o ofendido é um Deus de
uma dignidade infinita. Por isto também a gravidade do pecado é de
certo modo infinita. E isso, entre outros motivos, explica a eternidade
do inferno, pois a uma culpa de gravidade infinita corresponde uma pena
eterna.
Estado do pecador
Do que foi dito aparece a condição trágica do homem pecador. De um lado,
tendo sido criado por Deus e destinado a ser Seu filho, o homem tende
para Deus; e por outro, com o pecado tem que saldar uma dívida de
gravidade infinita e perdeu uma graça que não pertence à ordem natural,
mas supera a todas as forças da natureza. Por conseguinte, o homem
pecador é semelhante a uma águia que quer voar para o sol, mas tem as
asas cortadas. Santa Catarina, sempre genial, no Livro da divina
doutrina, tem um pensamento felicíssimo: “Entre o céu e a terra, entre o homem e Deus, há uma ponte e o pecado a fez voar”.
Depois que se quebrou esta ponte pela culpa de Adão em relação à
humanidade, e por qualquer pecado mortal nosso, somos impotentes para
alcançar o perdão e voltar a unir o céu com a terra. Voltamo-nos então
para as coisas criadas para amá-las e possuí-las fora de Deus e contra
Deus. Essas coisas criadas se assemelham às águas que continuamente
correm, e o homem é arrastado como o são as águas. O homem crê que
passam as coisas criadas que ama, e ele continuamente se precipita para a
morte. Quisera deter a sua própria existência e as coisas que ama, mas
tudo foge e corre para a eterna condenação.
Devemos então desesperar? Não, pois o Senhor dizia à Santa [Catarina de Sena]: “Fiz
de meu Filho uma ponte para que todos vós possais chegar ao vosso
fim... Contempla a ponte do meu Unigênito Filho e verás como a Sua
grandeza se estende do céu à terra, unindo com a grandeza da divindade a
terra da vossa humanidade... Esta ponte está levantada no alto e não
está separada da terra. Sabes quando foi levantada? Quando fui levantado
no madeiro da santíssima Cruz não me separando mais a natureza divina
da baixeza da terra de vossa humanidade...”.
Volvamos agora um olhar alegre a esta ponte divina: a Jesus Cristo, rei da história.
Recapitulação
A gravidade do pecado dos progenitores e de todo o pecado grave, se é
finita sobre o aspecto do sujeito e indefinida com relação aos defeitos,
torna-se infinita em relação a Deus. Na realidade, a gravidade de uma
culpa está em proporção com a dignidade da pessoa ofendida; e sendo Deus
infinito a pessoa ofendida, é evidente que a gravidade de um pecado
mortal é de certo modo infinita. Por conseguinte, o homem decaído se
achava impossibilitado de reparar adequadamente o mal feito e as suas
desastrosas consequências, pois não há proporção entre suas forças
finitas e a gravidade do pecado, como também entre a ordem sobrenatural
perdida. O Redentor prometido dá solução ao problema. Por isso, o
Redentor se torna o centro da história.
Fonte : http://blog.christifidei.com
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